18 agosto 2021

Cicatriz eterna (19/08/2011)

Ele então me olhou seriamente. Um olhar repreensivo, que me acusava de algo que eu não julgava cabível. E eu só sabia chorar e pedir a ele que parasse de me olhar daquele jeito recriminante, como se eu tivesse culpa pela dor que sentia. Mas ele não entendeu minha dor: nunca sofreu o que sofro, então nunca entenderia meu pesar... Me olhando, ele não proferiu uma única palavra durante uns vinte minutos. Só estudava meu rosto banhado em lágrimas e minha feição triste.
- Porque você sofre tanto? Se julga melhor ou pior que o resto do mundo? - finalmente, ele perguntou.
- Não... Você sabe que não é isso! Eu já te expliquei tantas vezes que eu não sei dizer o que acontece, só dói...só isso. -  respondi.
- O problema sou eu, não é mesmo? Você acha que todo o esforço que faço pra te fazer feliz não basta? Pode concordar! Eu sei que é isso... - ele vociferou.
- O problema nunca foi você. O problema sou eu e minha dificuldade de perceber que os outros não são obrigados a aturar a instabilidade dos meus sentimentos! Não quero que você ache que julgo seus esforços vãos. Você é o que me segura neste mundo... - desabafei, tentando amenizar a situação.
Neste momento, as pessoas nas mesas próximas à nossa olhavam, com curiosidade, a exaltação que nos movia e tentavam, de algum modo, saber qual era o motivo daquele tom elevado de voz.
- Eu sei qual é teu problema! - ele gritou. - Você se afunda nessas coisas que escreve naquele blog... Não percebe que aquilo só te faz mal?! Antes dele você era, sim, meio inconstante, chorava ás vezes, mas sempre passava! Agora não: você tá sempre deprimida, diz que se sente sozinha... Pô, quantas vezes mais vou ter que te dizer que eu tô aqui?! - ele indagou, como se aquela fosse a última vez que se disponibilizaria a cuidar de mim.
- Do jeito que você fala, parece até que acredita que eu tenha um gosto pelo sofrimento, pela dor... Eu cansei disso!! São só cobranças: "Olha, as coisas não andam bem... Você precisa mudar". Que droga! É impossível perceber que eu tô em frangalhos e que a última coisa que preciso agora são acusações de como estou sendo relapsa ou exagerada? Será que não dá pra você só me pegar no colo sem jogar isso na minha cara? - eu falei, expondo, também pela última vez, o que eu gostaria que aquela pessoa, talvez a única que eu ainda podia confiar, fizesse por mim.
Ele então chorou também. Um choro do menino que eu conhecia e não via, há anos. Cobriu o rosto com as mãos e disse que não podia mais. Levantou-se, tirou do bolso uma nota de dez reais, que, com certeza, cobriria os gastos com os dois sucos que havíamos pedido, jogou o dinheiro sobre a mesa e saiu rapidamente. Saiu do restaurante, das minhas vistas, da minha vida. Eu fiquei ali, olhando pros lados, esperando que ele voltasse, me tomasse nos braços e, pelo menos por alguns minutos, não dissesse nada sobre o quanto andava estranha e deprimida. Mas ele nunca mais voltou. Não até hoje.
Depois de tudo isso, eu gostaria de estufar o peito e dizer "Não, não. Eu não sofro mais. Aprendi a controlar aqueles momentos de dor na alma que eu sentia...", mas não, eu não seria capaz de mentir tanto assim.
Seis meses se passaram desde que ele foi embora, e ainda sou só a mesma menina que escreve em seu blog, com pouquíssimas visualizações de pessoas tão deprimidas quanto ela, o quão desgastante tem sido esperar pela volta improvável do amor do passado, de sempre. A mesma menina que transborda uma tristeza sem nome toda vez que relê as cartas com juras de amor que recebia de um "eterno" apaixonado, que numa tarde qualquer esqueceu-se de tudo que prometeu, deseternizou o amor de suas meigas palavras e partiu. Desde então, nada mais me prende ao mundo: tenho flutuado sobre as recordações, sobre o que poderia ter sido.
E não sofro pela dureza do"'adeus", mas pela falácia do "pra sempre"... Sofro por ter acreditado na eternidade - a mentira mais contada, o engano mais dolorido. No final das contas, a única coisa realmente eterna é a cicatriz que essa palavra deixou, deixa e ainda vai deixar em tantos corações por aí.

2 comentários:

  1. que seja infinito ENQUANTO DURE.

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    Triste... Lindas palavras, senti que foi bem intimo esse teu texto.
    Te amo (e bem, por que você acha que eu te dizia "estou te amando", assim no tempo presente? Tive minhas duras penas para entender a eternidade do amor também.

    E te amo. Prasempre, arrisco
    (L)

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  2. O tempo não se aplica a nosso amor, meu aedo! Ele é único e vive só por ele mesmo. As coisas alheias a ele, bem, são SÓ coisas alheias a ele!
    Somos mais!
    Te amo!

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